Psiquiatra defende que “seria importante expandir esta oferta no SNS, nos locais onde existem profissionais treinados para gerir este tipo de casos, para chegar a um tipo específico de população”.
Público, 21 de Novembro de 2023
Autor: Amílcar Correia
Os resultados dos tratamentos com cetamina [ou ketamina] de doentes com depressão resistente no Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa permitem concluir que os sintomas se reduziram em 70% dos casos. Numa proporção ligeiramente inferior, de 60% da amostra, os sintomas que persistiam deixaram de ser suficientes para um diagnóstico de depressão. Mais: três meses depois da conclusão do tratamento, metade das pessoas continuava sem sinais de depressão.
Vamos por partes. A cetamina começou a ser utilizada como um medicamento anestésico nos anos 60, mas, como relatavam várias pessoas ao acordar, cedo se percebeu que provocava sonhos estranhos e intensos. Mais tarde, aquele medicamento seria utilizado na Rússia como modelo de terapia assistida com psicadélicos. A experiência não durou muito tempo. Os psicadélicos seriam banidos do país. É já neste século que surge o “reinteresse pela cetamina como antidepressivo rápido”, explica Pedro Castro Rodrigues, coordenador da Unidade de Depressão resistente daquele centro hospitalar.
Esta unidade iniciou o tratamento com ketamina há um ano com um grupo de 12 pessoas, às quais foi diagnosticada depressão resistente […]. O que acontece, como escreveu Pedro Castro Rodrigues, juntamente com Miriam Mergulho e Inês Figueiredo, num artigo científico publicado no Journal of Psychopharmacology, é que aquele medicamento aumenta a neuroplasticidade, ou seja, a capacidade do cérebro para estabelecer novas ligações neuronais, o que faz com que este fique mais “modelável” no dia seguinte e aumente as probabilidade de a psicoterapia ser bem-sucedida. […]
No fundo, o aparente sucesso decorre desta combinação entre o aumento da neuroplasticidade e a libertação dos padrões mais rígidos, num contexto e acompanhamento adequados, “que favorecem a intervenção psicoterapêutica”.